"O apartamento fica no térreo de um edifício antigo (no Brasil, antigo quer dizer anos 50). Atravessamos uma porta pesada, viramos à esquerda e caímos numa contradição: uma saleta enorme - quando é sabido que as saletas, por definição, são pequenas. A salinha ficou grande porque há espelhos por todo lado, do chão ao teto, refletindo um lustre de cristal um pouco menor do que a catedral de Chartres, cortinas pesadas como mármore e um deslumbrante busto marroquino, de mármore de verdade. O andar de baixo tem 150 metros quadrados. Guilherme achou pouco e comprou o de cima, com 180 metros. Cada centímetro cúbico está ocupado por bibelôs, peças de antiguidade, objetos artísticos, adereços, cadeiras, almofadas, tapeçarias, biombos, estatuetas, cinzeiros, revistas, tapetes de zebra com rabo e tudo, pufes, poltronas forradas de pele de tigre, porta-retratos com fotos das maiores amigas do proprietário, estantes com livros encadernados em couro, vasos de todos os tamanhos e formatos, troços, coisas, trecos. Orgulhoso, ele nos mostra um pequeno tinteiro recoberto com couro de crocodilo negro do Nilo, e com estabilizador, para o caso de o navio balançar - foi do Titanic. Guilherme sabe de onde cada objeto veio, quando o comprou e onde o viu pela primeira vez. Ele aponta tudo, e, estranhamente, não nos convida a sentar. Parece um tanto aflito quando ameaçamos tocar em algo. Esclarece que é proibido sentar nos sofás e cadeiras, para não amassar as almofadas de plumas. Também não se bate a cinza nos cinzeiros, para não sujar. Uma de suas muitas loucuras é ter a casa arrumada em excesso, arrumadéssima, repleta de flores e com suas centenas de objetos no lugar certo. Se um deles estiver um centímetro mais para lá ou para cá, ele, enquanto conversa, dá uns passinhos curtos e o põe no ponto exato em que deveria estar. Aos amigos, serve Black Label, que ele faz o sacrifício de tomar, às vezes.Champagne, nem pensar.Se vir um pote de margarina na microcozinha, é capaz de ter um troço. Comida, em sua casa, sob nenhuma hipótese - e empregada também não. Luiz, o faxineiro, vai uma vez por semana fazer a limpeza, e é proibido de emitir qualquer som enquanto trabalha… (.) Seguimos para um restaurante das imediações… (.) Terminado o jantar, acha melhor pegar um táxi, apesar de estar a cem metros de casa. Seguimos juntos no táxi, que faz uma volta imensa, pois o prédio dele fica na contramão. A última surpresa: Guilherme manda o carro parar na frente do Hotel Glória. E nos informa, como se fosse a coisa mais natural do mundo, que nunca, nunca mesmo, dorme no apartamento. Ele tem uma suíte permanente no Glória, e sempre dorme nela quando está no Rio. 'Faço como Mlle. Chanel, que morava na rue Cambon, mas dormia no Ritz.' Meu palpite: dorme fora para não desarrumar a cama."
É da Danuza Leão, achei por aí na internet, não é ótimo ? Queria conhecer esse apartamento !