O POVO DA NOITE FOI DESTAQUE EM DUAS MATÉRIAS NO JORNAL O GLOBO DESTE DOMINGO
O fim de uma era na cultura ‘club’ carioca
Com o fechamento do Dama de Ferro, Rio perde o que já foi seu principal palco de novidades das pistas internacionais
RIO - Há duas semanas o Facebook trouxe uma notícia que fez tremer as bases da cultura club carioca: Adriana Lima, produtora e dona do clube Dama de Ferro, em Ipanema, anunciava a decisão de "passar o ponto", depois de dez anos de funcionamento ininterrupto da pista de Ipanema. O texto também avisava que a última noite, ainda sem data, se chamará "Bye, bye, Dama" e que os interessados no negócio deveriam enviar um e-mail para a (ex?)empresária.A reação foi imediata. Dezenas de comentários lamentando a decisão de Adriana apareciam a cada minuto no post. Eram frequentadores, DJs, VJs, produtores e toda uma geração que teve na boate carioca o principal palco de acesso às novidades das pistas internacionais, leiam-se as tendências musicais do eletrônico underground que mais tarde são, invariavelmente, diluídas no disco do ícone pop mais cafona.
— Acho que contribuí bastante com a cultura da cidade, mas atualmente ando interessada em outras coisas. Para mim, já deu — diz Adriana.
Festa Moo começou lá
A contribuição foi ampla, geral e irrestrita. Como um dos principais palcos para o exercício da cultura dos clubes no Rio, o Dama foi palco de apresentações de artistas internacionais de relevância legitimada por críticos e publicações especializadas, foi "incubadora" de personagens que se tornaram produtivos no mundo noturno da cidade e, de quebra, abriu as portas para as primeiras versões de festas que viriam a ser emblemas cariocas, como Moo, Se joga! e Do Hauze, entre outras.
— O Dama é um lugar onde um DJ como o Carl Craig pode tocar para uma pista repleta de amigos, o clima escuro de inferninho parece amigável e em que dá para encontrar gente nova enquanto se diverte com todos os conhecidos ao redor — diz o DJ e produtor Eduardo Christoph, um dos criadores da Moo. — O começo da festa deu tão certo lá que a gente lotava a boate em plena quarta-feira.
A lembrança do set do DJ americano Carl Craig não pertence apenas à memória de Christoph. Quase todos os que estiveram naquela noite de março de 2007 apontam a apresentação como "histórica", não apenas por Craig ser um dos pioneiros do techno de Detroit mas porque o show foi, de fato, uma aula para DJs locais. Craig recriou sons ao vivo, desconstruindo ritmos e beats e hipnotizando os fãs de eletrônica.
— Ele amou aquela noite e ficou hospedado lá em casa — conta Adriana, com a informalidade que marcou a trajetória do Dama.
O DJ americano Larry Tee, mentor do movimento Electroclash, que chacoalhou as pistas no início da década, também teve no Dama seu melhor pouso por estas bandas.
— Depois de o Larry tocar para a gente, começamos a receber um DJ gringo por semana — conta Adriana, que sempre tratou a boate como uma extensão da sua casa, ambientada, como o Dama, com paredes de cimento e habitada por móveis de ferro.
São peças assinadas pela versão escultora da empresária, especializada na torção e no tratamento de metais que usa para criar as obras de arte, às quais ela voltará a se dedicar depois que o último convidado tiver deixado a festa de encerramento.
— Vou tirar o "dama" e ficar apenas com o "de ferro" — diverte-se ela.
Aliás, Adriana anda se divertindo muito mesmo.
— Não tem esse clima de tristeza, arrependimento, nenhum desses sentimentos ruins. É apenas uma fase nova para mim — resume.
O fim do Dama de Ferro deverá marcar o início de uma nova fase para toda a noite carioca. Qual será a próxima atração?
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